Quando sou perguntado a respeito de meu gênero de cinema favorito ou alguma questão semelhante, por vezes fico exasperado sem saber como responder, não tenho uma resposta fácil, por até mesmo não ter um gênero favorito. Particularmente, me interesso mais por temáticas e afins.
Mas noto que na minha lista de filmes favoritos, um gênero ou subgênero aparece com um freqüência ligeiramente maior, mas muito ligeiramente mesmo. Falo dos road-movies.
Dentre os meus road-movies favoritos, um entrou na lista recentemente, Two-Lane Blacktop. Lançado em 1971, "Two-Lane Blacktop" é indiscutivelmente um dos melhores road-movies existenciais feitos entre o final dos anos 60, início dos anos 70 (incluindo aí "Easy Rider" e "Vanishing Point", esse aqui um favorito também e sobre o qual um dia falarei). O diretor Monte Hellman faz um exame cru, por vezes contundente, da alienação americana. O filme é simplesmente brilhante devido à sua recusa em ceder as facilidades do mero comercialismo. Um filme sobre um grupo em busca de corridas de carro aonde não se vê corridas de carro. Aliás, existe até uma corrida em "Two-Lane Blacktop", embora essa pareça terminar antes mesmo de começar. Existem extraordinários muscle cars também. Mas Two-Lane Blacktop é um estudo de personagens, embora os personagens não sejam pessoas como nós particularmente conhecemos.Os três principais personagens, almas perdidas num vazio de identidade e emoção. James Taylor (sim, aquele cantor mela-cueca trazido ao rock in rio por Roberto Medina), Dennis Wilson (o único surfista de verdade dos beach boys) e Warren Oates (não é o Oates de hall & oates) vivem os personagens principais, o que poderia já causar um certo estranhamento, mas o filme é muito bom. Taylor e Wilson cruzam silenciosamente as pequenas estradas do interior dos EUA procurando pela próxima corrida em seu Chevy ‘55. Eles acabam encontrando com Oates, um sujeito meio nervoso e tagarela que vive perdido em algum tipo de crise de meia-idade, enquanto leva caronistas no seu GTO.Acrescente nesta mistura uma jovem caronista interpretada de maneira soberba por Laurie Bird. Ela salta para frente e para trás entre estes três homens, sempre evitando suas desastradas tentativas de assédio.
"Two-Lane Blacktop" é um estudo de homens tristes perpetuamente perdidos em alguma desconhecida paisagem americana. Eles são fantasmas pairando, sem identidade, para sempre à procura de um sentido que não pode ser encontrado. Não há respostas nem verdades simplórias na complexa odisseia de Hellman. Estes homens estão presos, os seus carros servindo como caixões ambulantes, sem resgate aparente na próxima curva, destinados inexoravelmente a avançar cada vez ainda mais longe.
O início dos anos 1970, a música vinda do rádio AM, combinado com postos de gasolina anónimos, restaurantes de beira-de-estrada (ainda tem hífen?) e numerosas pequenas localidades, tudo contribui para o efeito global do sombrio estudo de personagem que Hellman fez. "Two-Lane Blacktop" é um dos melhores filmes americanos, e que quase ninguém jamais ouviu falar.